Educadores(as) entre a Exaustão e o Afastamento
Depressão, ansiedade e outros transtornos contribuem para o esgotamento mental de profissionais da educação. Os alunos também têm sintomas similares e naturalmente buscam acolhimento escolar, familiar e social.
Durante o período de isolamento social, tanto estudantes quanto profissionais de educação tiveram sobrecarga de estresse. Patrícia Rabelo, coordenadora de uma escola particular em Pará de Minas, MG, conta que sentiu o trabalho aumentar muito após a suspensão das aulas presenciais, em 2020. A adaptação dos profissionais às tecnologias remotas foi muito difícil. “Ninguém estava preparado”, recorda. Seu filho, que na época cursava o ensino médio, sofreu pela falta de socialização. “Por ser diabético, era do grupo de risco e só voltou após a segunda dose da vacina. Nós ficamos mais de um ano sem encontrar nossas famílias e eu não exigia que meu filho tivesse compromisso pedagógico, queria apenas manter sua saúde mental preservada.”
No início deste ano, ela sentiu na pele todo o estresse causado pelos anos de exaustão e muita cobrança no trabalho. “Após o primeiro dia de aula de 2023, quando trabalhei das 7h às 22h, eu surtei. No dia seguinte, na terapia, perdi o controle, chorei muito. Até hoje estou tomando remédios”, conta.
Adoecimento da comunidade escolar
Diversas pesquisas realizadas nos últimos anos apontam que o adoecimento da comunidade escolar é um dos principais problemas a serem enfrentados hoje pela escola. Uma das mais recentes, Futuro da docência, realizada pela ONG Conectando Saberes e divulgada em fevereiro deste ano, mostrou que 75,5% dos profissionais da rede pública e privada no Brasil acreditam que questões psicológicas são um dos principais fatores que fazem os professores desistirem da carreira. O levantamento ouviu 6.430 profissionais da educação de todo o país. Outra pesquisa, Saúde mental dos educadores 2022, realizada pela Nova Escola em parceria com o Instituto Ame sua Mente, mostrou que mais de 20% dos profissionais consideram sua saúde mental ruim ou muito ruim. Os principais problemas apontados são: ansiedade (60,1%), cansaço excessivo (48,1%) e insônia (41,1%).
O professor de matemática da rede estadual de Minas Gerais Delcio de Brito Chagas, de 63 anos, começou a dar aula em 1994. Hoje, é o responsável pela biblioteca de uma unidade. Foi afastado da sala de aula por questões relacionadas ao estresse. “O professor está sempre mais desmotivado, mais triste e muito ansioso. Acho que as novas gerações estão desinteressadas pela escola. A diretora pediu a minha transferência para a biblioteca porque estava muito nervoso e poderia perder meu cargo como professor”, revela.
Outros professores, como é o caso de Thiago Luiz Santos de Oliveira, 42 anos, já tiveram que ser internados para tratar doenças relacionadas à saúde mental. Ele vem lutando contra uma depressão que o levou a diversas crises de ansiedade e ao afastamento do trabalho. Professor efetivo em uma escola estadual de Belo Horizonte desde 2006, foi coordenador e vice-diretor da unidade, mas começou a sofrer perseguições internas por colegas que não queriam vê-lo ganhando espaço.
É um esgotamento em função do ambiente, você tem vontade de trabalhar, mas o meio não contribui para o mínimo necessário. O problema não eram meus alunos, era a falta de motivação vinda da própria diretoria”, comenta.
Ainda afastado de suas atividades por questões de saúde mental, ele não quer mais trabalhar naquela unidade, mas não desistiu da profissão. “Penso que, apesar dos problemas, existem escolas que oferecem ambientes mais saudáveis para realização do trabalho docente”, conclui.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) confirma que o problema se agravou em função da pandemia da covid-19. Um levantamento chamado Novas formas de trabalhar, novos modos de adoecer, divulgado pela entidade no final de 2021, mostra que a ansiedade, depressão e o sentimento de desesperança estão entre os problemas que mais acometeram os professores durante o distanciamento social. Para a secretária nacional da CNTE de Saúde do Trabalhador da Educação, Francisca Seixas, cabe aos governos políticas públicas para prevenção e tratamento das pessoas adoecidas.
“Precisamos de uma mudança no modelo de gestão que passe a valorizar o professor e dê espaço para que os profissionais e estudantes se expressem. O acompanhamento psicológico da comunidade escolar deve ser permanente, com prevenção à violência que afeta todas as pessoas envolvidas na escola”, ressalta.
Caminhos para a superação
A onda de ataques em escolas que chocou o país recentemente pode estar relacionada também a sofrimentos e mágoas que ex-alunos sentem do ambiente escolar. É o que avalia Ana Carolina D’Agostini, psicóloga, pedagoga e coordenadora de formações do Instituto Ame sua Mente. “Estamos vivendo o começo do fim de uma pandemia, em que a ansiedade e a depressão fizeram parte da realidade de muita gente. O problema agora é mais latente, é a violência armada, que muda totalmente o cotidiano de uma escola”, afirma.